segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Subsolo: Ordem de Despejo

Tive o prazer de conversar com o Shawlin e o Lumbriga sobre o Subsolo, grupo que abrange a maioria dos ex-integrantes do Quinto Andar. O resultado foi uma entrevista bem legal com os dois para o Bocada Forte. Confira aqui. E, claro, também escrevi sobre o disco, e vocês podem ver tanto aqui no blog quanto no Bocada.

Em qualquer época de nossas vidas, um dos nossos maiores desejos é estar sempre com os amigos por perto. Viajar com eles, divertir-se com eles. Fazer as coisas que mais gostamos no mundo junto com eles. Tudo parece melhor, mais fácil, mais prazeroso. Imagine, então, quando um grupo de amigos se junta durante um mês para fazer aquilo que eles mais gostam e que sabem fazer de melhor na vida. Afastados de tudo, do caos, dos estresses, focados apenas em fazer música. Pois o Subsolo fez isso. O resultado? Você já deve saber qual é.

Formado por ex-integrantes do extinto coletivo Quinto Andar – a saber: Gato Congelado, Kamau, Lumbriga, DJ Mako, Matéria-Prima, Pai Lua, Shawlin e Xará -, o grupo ficou por um mês isolado em um sítio no interior de São Paulo gravando um novo disco, algo muito esperado por todos os fãs do rap underground brasileiro. A reunião poderia ter refletido até num clima mais positivo, mais festivo no álbum. Mas foi exatamente o contrário.

Produzido majoritariamente por Shaw e Lumbriga, o disco tem um clima sombrio, meio melancólico, meio sinistro, durante todas as suas faixas, algo bem diferente do antigo grupo dos caras. As batidas pesadas e os samples obscuros predominam tanto que até o batidão funk de "Rio Babilônia" abandona o clichê dançante do gênero carioca e dá lugar a um relato duro da cidade maravilhosa, na voz de Pai Lua. A mistura entre o tamborzão e strings turvas simboliza bem o que o Subsolo tem a oferecer no disco: letras sinceras e beats sujos, mas tocantes.

Falando em letras, o coletivo também mostra que todo o esmero na gravação foi valioso: os temas variam desde a interpretações de obras da literatura, como em “Ensaio sobre a cegueira”, até músicas mais românticas, a charmosa "Nem Sei", produzida pelo falecido DJ Primo, passando também pelos tradicionais ataques aos falsos amigos, em “Destruir”, com um verso estonteante de Kamau:

“Eu só posso falar da minha, mantenho, não perco a linha
Me empenho, sem picuinha, não venho com conversinha
Se todo homem tem o seu preço, não sei o meu
Não sei o valor da alma, da vida que Deus me deu
Mas me apego como se fosse tudo que me resta
Coisa que não se troca, não se aluga, não se empresta

Pra um monte eu sei que é festa, qualquer trocado serve
Mas minha estadia é breve, não deixo que me leve
Quem deve teme, se esconde, nunca me pergunte onde
Não espere que eu aponte, verdade bebo na fonte
Conte comigo pra ser inocente como criança
Astuto como adulto, mas ainda na esperança de encontrar
Um caminho mais tranqüilo pra minha meta
Com altos e baixos, mas bem melhor que a linha reta

Que seduz por ser mais fácil, mas leva à vergonha eterna”

Os temas mais filosóficos também funcionam bem, graças à capacidade lírica dos integrantes. “Limpe seu coração” tem uma letra sensacional, em tom meio reconciliatório, meio nostálgico, sobre um piano discreto e samples sombrios. Já “Dias em branco” traz Lumbriga e Gato Congelado trocando versos de altíssimo nível, falando sobre vários assuntos e com punchlines atordoantes, tudo sobre um instrumental menos tradicional, meio Wu-Tang.

Porém, quando a proposta do grupo de tons musicais mais cinzas é maximizada é que surgem as grandes jóias do disco. “Ninguém ama os náufragos” tem um conceito inteligente, original e ao mesmo tempo simples. A música conta a história de um velho no seu momento derradeiro de morrer, aquele em que, dizem, nós vemos nossa vida passar nos nossos olhos. E é isso que Shawlin, Lumbriga e Matéria-Prima relatam, ao narrar a vida triste e solitária de um idoso, em uma das melhores performances líricas do disco. O instrumental da faixa parece conversar com as rimas e adicionar mais um background para a história: os hi-hats acelerados estão para a velocidade em que os acontecimentos passam pela cabeça do velho assim como o sample melancólico está para o sentimento do personagem. Além desta música, a caótica “Papo de futuro” mostra a opinião do grupo acerca dos novos tempos que vivemos. Sobre um beat pesado, com as caixas caindo como se fossem bombas explodindo numa guerra urbana, Lumbriga, Matéria Prima e Shaw relatam o caos urbano, como observadores. Mas é Pai Lua quem rouba a cena, narrando como se estivesse diretamente do olho do furacão:

“Câmbio, câmbio! Tá me escutando?
O bicho ta pegando, vagabundo se matando
Já nem sei quem é humano, vou te contar
Tô dormindo há uma semana, e se eu dormir é pra não voltar
Até a noite resolveu se revoltar, pra tu ver
A lua e as estrelas decidiram abandonar

Esse fim de mundo não é lugar pra viver”

Assim, misturando rimas consistentes a uma produção bem cuidada e bem direcionada, o Subsolo mostra como uma reunião de amigos pode ser produtiva, principalmente quando se juntam em função de uma paixão em comum. A fuga da cidade para o sítio resultou não só num trabalho honesto e completo, mas também num tratado sobre a babilônia moderna pelas lentes de jovens cheios de coisas para dizer. A descida do quinto andar para o subsolo mostrou-se bastante oportuna para os caras.

13 comentários:

Unknown disse...

po mano,cade o link pra down????

eu curti a "destruir" no myspace dos manos!..
to querendo curtir o resto po!
põe o link ai pra nois!!...

Gusta disse...

ótima resenha de um ótimo disco!

tem q ter mais resenha de discos nacionais por aqui, mesmo que nao seja possivel um link pra download.
Suas resenhas sao mto boas.

Abraço!

Algoz disse...

Cada vez melhor!
É isso Felipe!
Paz

Anônimo disse...

Maneirinho. Mas o De Leve fazia Quinto Andar ser o que era.

Felipe Schmidt disse...

Daniel, dessa vez eu vou ficar devendo o link, não seria justo com os caras fazer isso. Eles me atenderam super bem na hora da entrevista, se dedicaram pra caramba pra fazer o disco, não seria correto da minha parte postar o link do disco.

Se um dia eles liberarem, coloco aqui com todo o prazer.

Gusta, a intenção é ter cada vez mais resenhas de discos nacionais, com ou sem link. POde aguardar mais coisas ;)

Abraços!

Unknown disse...

pode crer mano eu entendo!!...
ja aconteceu isso com o disco do "kamau"....mas fica na PAZ!!

FLW!!

Anônimo disse...

Muito fóda u som dus loco!

Thiago disse...

A Mlk muito bom as espectativa d sub solo, muito bem explicado, queria ter a mesma sorte que vc teve de falar com shw e lumbriga. eles são otimos e estoraram nesse som. corti a descrição abraço

Unknown disse...

Aêe, o trecho da música "Papo de futuro" que foi postado tem um erro, o certo é: " Tô acordado há uma semana e se eu dormir é pra não voltar ". Só um toque, PAZ!

Gianluca disse...

Esse disco mudou minha vida..um dos melhores!
Grato ao subsolo..paz aí galera

Vitória - ES

shadz disse...

Na música Destruir tem essa parte"Mesmo que destrua a cidade" é um sampler ou é original da música? e se for sampler qual a música original?

Anônimo disse...

obrigado pela resenha bem elaborada. a nova escola como eu agradece mt por podermos beber de uma fonte boa como essa

versatilijade disse...

to com disco aqui em mãos, e tava tentando lembrar qual era o ano, agora já sei 2008, valeu por postar!!! esse album é maravilhoso em todos os sentidos.. tem uma arte foda pra caralho mas os caras ficaram devendo o ano kkkkk tudo bem a gente perdoa, vou anotar pra não esquecer no cantinho, estilo o selinho da compact disc que colocaram de lado embaixo da escada ;P