terça-feira, 22 de setembro de 2009

Brother Ali: Us

Ano: 2009
Gravadora: Rhymesayers
Produtor: Ant (todas as faixas).
Participações: Chuck D (faixa 1), Stokley Williams (1 e 16), Joell Ortiz (12), Freeway (12).

O que fazer quando você é um emcee respeitado por 90% daqueles expostos à sua música, já lançou dois álbuns elogiadíssimos pela crítica especializada e tornou-se um exemplo de sucesso underground, sem fazer nenhuma concessão ao mainstream? Pois Brother Ali, o tal rapper, resolveu mudar o foco do seu trabalho. Em vez das letras ultrapessoais que falavam de preconceito e superação e das fortes mensagens sociais, o cara apostou em outra forma de apresentar sua verdade. Em "Us", o novo álbum do nativo de Minnesotta, sai o "eu" das rimas, entra o "nós" e inúmeras estórias emergem.

Os versos da faixa-título - incompreensivelmente a última do disco, quando encaixaria perfeitamente como a introdutória - são o indício do que esperar da lírica de Ali: estórias que, muito possivelmente, são extremamente identificáveis. A breve explanação de que "não se trata de eu ou você, e sim nós" justifica nas entrelinhas a mudança de marchas que o emcee albino promove em "Us"; aquela velha história de que unidos somos fortes, divididos caíremos há tempos não fazia tanto sentido.

E é com base nisso que Ali se aventura até por temas tabus, que teoricamente não teriam a ver com ele. "The Travelers" trata de escravidão, mas de uma maneira profunda, inquisitiva, tentando entender a herança que a prática maldita deixou até hoje na sociedade. E é nesta faixa, na metade do disco, que você se convence de que Ali pode definitivamente falar do que quiser, e o fará com propriedade e técnica. O primeiro verso é contado sob a perspectiva de um escravo, ainda atordoado por ter sido "caçado" em sua terra natal; a segunda parte é entregue ao outro lado, que efetivamente faz a tal análise. O refrão junta tudo como cola final: "E isso é realmente verdade / agora pare e imagine se tivesse sido contigo / agora pare de imaginar, descubra a verdade / e se pergunte com quem isto está acontecendo".

E as narrativas do álbum não param por aí. Uma das grandes virtudes do The Brother no trabalho é conseguir incutir dentro das estórias as críticas sociais que ele fazia antes de forma mais direta. Talvez isso seja sinal de maturidade e evolução na escrita, mas a verdade é que uma maneira muito mais rica e profunda de criticar as coisas. Não basta dizer que nossa sociedade está podre, é necessário contar a história de um adolescente gay, filho de um pastor e uma professora, com o irmão capitão do time de futebol americano, que vive duas vidas para que o genitor não descubra que ele é algo que "o levaria para o inferno". É necessário falar sobre o filho de pais separados que se vê dividido entre duas casas - "e nenhuma delas é realmente a dele" - vendo os pais reconstruírem suas vidas e negligenciando a dele. Tudo isso é tema na fenomenal "Tight Rope", desde já candidata a letra do ano, que consegue despertar tantas reflexões e sentimentos quanto possível.

Talvez Ali vá além das já triviais críticas ao sistema. Ele revela a verdadeira causa do sistema: as pessoas. Desde o estupro em "Babygirl" até as drogas em "House Keys", o rapper mostra que se a sociedade é do jeito que é, ela é apenas nosso reflexo. Nossos defeitos, nossas falhas de caráter, nossa ganância, enfim, este é o câncer que tanto procuramos e combatemos. E as rimas desde muçulmano albino, acostumado a ser intimidado no colégio quando criança, soam como dardos letais atirados na nossa cara. É a tal verdade à qual ele tanto se refere; "shame on us", como ele diz no final de "Tight Rope".

Mas não é só de roteiros densos que o álbum é feito. As rimas pessoais de Ali aparecem de vez em quando. O hino de celebração da vida em "Fresh Air" é capaz de despertar inveja até nas pessoas mais puras e passa longe de soar como se o cara estivesse se gabando. "You Say (Puppy Love)", por sua vez, é uma daquelas canções românticas que você vai mandar para a sua namorada via MSN e colocar numa compilação de músicas dedicadas a ela.

Na produção, entretanto, pouca coisa mudou. O produtor do Atmosphere, Anthony Ant Davis, continua no comando dos beats e mostra que continua um dos mais consistentes da cena. Ele emprega uma sonoridade com a mesma estética do último trabalho com Slug, recorrendo a uma mistura de instrumentos e samples que dá vida a instrumentais polidos, cheios de soul. O que chama a atenção é que as batidas parecem mais minimalistas em "Us", talvez abrindo espaço para as narrativas de Ali. Essa fórmula, porém, faz com que algumas produções soem até simplistas, como a irritantemente repetitiva "Crown Jewel".

Mas é verdade também que os acertos são muitos. "The Preacher" aposta num naipe de metais extremamente suingado e abre o disco perfeitamente. "Fresh Air" casa perfeitamente com a temática da letra, graças a uma batida funky até o caroço. O clima tranquilo e reminiscente proporcionado pelas strings de "You Say (Puppy Love)" é outro ponto alto do disco, assim como "Us", uma mistura de coral gospel com palmas emocionantes que faz da faixa a melhor do álbum.

Tropeços na produção à parte, "Us" desponta como um dos bons álbuns do ótimo ano de 2009 graças à performance de Brother Ali. O flow continua impecável, uma variação entre levada e cantoria que denuncia um cara extremamente à vontade com as batidas. Mas é na decisão de elevar o radar de sua caneta para a sociedade de uma forma diferente onde mora a grande força do disco, o grande pulo de Ali. Obviamente, o resultado não é tão místico quanto ele faz crer, mas a verdade é que, depois das estórias deste trabalho, você estará mais próximo de você mesmo, das pessoas, da...verdade.

Brother Ali - Us
01 Brothers and Sisters
02 The Preacher
03 Crown Jewel
04 House Keys
05 Fresh Air
06 Tight Rope
07 Breakin Dawn
08 The Travelers
09 Babygirl
10 Round Here
11 Bad Mufucker Pt.2
12 Best@it
13 Games
14 Slippin Away
15 You Say (Puppy Love)
16 Us

Leia a tradução de "Us"

Vídeo da faixa "Us":

10 comentários:

Anônimo disse...

the preacher (que seria o titulo do disco), é o beat mais sinistro desse album... Ali representou de novo. E num review que li sobre uma comparacao que jay-z fez do rap atual com o rock dos meio dos anos 80, assim como jay esta para o whitesnake, Ali esta para Pixies...

Ele amadureceu muito nesse discos, e ja um dos meus favoritos do ano junto com Rae e Tyie Phoenix (essa ultima e uma pena nao ter saido nada em vinil)

Felipe e a parada do dominio? te mandei um email, vamos agilizar isso o boom bap ja amadureceu e precisa de uma nova casa...

tb preciso te mandar o cd,

abs.

f-zero : materialcorrosivo.com

Anônimo disse...

ta, mas e o link pra download?

CASÉ disse...

kkkkkkkk...

Unknown disse...

se não for o melhor do ano, com certeza fica entre os 5...

fazia tempo que eu não ouvia um disco inteiro, sem pular nenhuma faixa;

Alexandrefm disse...

muitoooooooooooooooooo bom esse cd
vale apena o cara escuta e refletir sobre algumas musicas
vlww esse blog ai na paro de olhar todo dia muito bom mesmo cara , parabens continue assim e evoluindo!

Diego Ellwanger Pereira disse...

Muito do caralho essa letra "US". Senti frmz no cara.

Gusta disse...

discaço mesmo!
me arrisco a dizer que é o melhor disco do Ali.
E só não digo que é o álbum do ano porque já falei isso de uns dez álbuns só nesses nove meses de 2009.

Abração aê

Anônimo disse...

ali comeca sua turne do album us, junto com evidence, toki wright e o dj bk one (q tambem ta lancando um disco com influencia/samples de musica brasileira chamada radio do canibal), e pra tirar um barato fizeram um som pra ser o hino da turne ... vejam ai, http://www.youtube.com/watch?v=DYky7kUWP_4

f-zero

Unknown disse...

aew mano, será que você poderia traduzir a música Tight Rope;; pelo que você disse, pode ser consiferada uma das melhore letras do ano, então acho que ela merece;;

parabéns pelo blog, cada vez mais loko;;

Robson Araujo disse...

Muito bom o disco...